Das docas de Santos à Esplanada dos Ministérios
Importa o tráfico de influência de Rose, mas ninguém fala da propina que beira a Esplanada.
Decerto, sem que o capeta tivesse conhecimento, a então primeira-dama da Série B do governo Dilma, Rosemary Nódoa Noronha, usou e abusou do órgão em que Lula a acomodou para transar em 2004 a derrubada de João Delfino Rezende de Pádua do cargo de chefe da Controladoria-Geral da União em São Paulo. A alegação de Rose era que ele "contrariava interesses da União".
A telefonista predileta de Lula, sem dar uma ligadinha sequer para seu telefonista do coração, cutucou seu braço-direito na Agência Nacional de Águas, Paulo Vieira incitando-o a pedir a troca de comando da CGU, organismo que - veja só! - combate a corrupção com verbas federais.
A patifaria veio à tona porque a operação Porto Seguro abortou uma troca de e-mails feita em 8 de junho de 2004, em que Vieira encaminha a Rose, com "saudações petistas", um relato do descontentamento de setores da sigla com Pádua, que havia sido nomeado em fevereiro daquele mesmo ano.
O jornal Folha de São Paulo na sua edição desta sexta-feira bota os podres pra fora da dupla de dois, interpretada por três. E conta o que está na mensagem eletrônica:
Vieira reclama que, após Pádua assumir, afastou quatro pessoas ligadas ao PT dos cargos comissionados da CGU em São Paulo.Diz ainda que Pádua fica divulgando sua falta de ligação com o PT: "O chefe da CGU [Pádua] e os indicados para os outros DAS [comissionados] reafirmam constantemente de forma pública que não são ligados ao PT e não apoiam as diretrizes de governo do partido."
Segundo o documento, após a posse de Pádua, entidades comandadas pelo PT no Estado passaram a sofrer "perseguições" da CGU.
Foto: Revista Portuária
A queda de braço entre arrendatários e interessados na licitação da área é permanente, com lobistas de tudo que é lado. A receita diária dos terminais é de mais de US$ 2 milhões. Nada melhor do que decidir quem fica com que e com quantos armazéns. Licitação é o de menos.
A carta faz menção à Codesp (Companhia Docas do Estado de São Paulo), (*!) que administra o porto de Santos, vital para os interesses do grupo desarticulado pela PF em novembro. Em 2004, Vieira era presidente do conselho fiscal da empresa.
Os anexos do e-mail de Vieira são reportagens sobre auditorias da CGU que apontavam irregularidades na Codesp em 2003. Ele reclama a Rose que relatórios internos da CGU estavam sendo vazados à imprensa.
Rose atendeu o pedido de Vieira. Em 28 de junho, ela encaminhou a mensagem a uma assessora do então ministro da Casa Civil, José Dirceu, frisando que se trata de uma correspondência "em caráter reservado". Rose havia trabalhado com Dirceu durante mais de uma década.
Em um dos anexos foi enviado o currículo do suposto escolhido do partido para o cargo, Alexandre Forte Rodrigues. Conforme Vieira, Rodrigues foi escolhido após consultas a prefeitos e vereadores do PT de São Paulo.
Ontem, Rodrigues, que já trabalhava na CGU em 2004, disse desconhecer as pressões por seu nome. "Havia um descontentamento com Pádua, e Paulo [Vieira] deve ter se aproveitado disso. Paulo realmente demonstrava ter poder no PT. Fiquei surpreso com o que ocorreu com ele", declarou Rodrigues.
O trabalho de bastidores entre Rose e Vieira, porém, não deu resultado. Pádua só deixou a chefia da CGU três anos depois, em maio de 2007. Hoje, está aposentado.
(*!) - Companhia Docas do Estado de São Paulo - O organismo administra o porto de Santos. É só um lugar que aproxima a operação Porto Seguro de, ninguém mais nem menos do que Michel Temer, vice-presidente do governo Dilma; um lugar que remete ao breve tempo em que Temer padece investigação no STF sob suspeita de participar de um esquema de cobrança de propina de empresas com contratos em vigor no seguro porto de Santos.
Para você ter só uma leve ideia, um dos presidentes que ele indicou se chama Wagner Rossi, aquele que saiu pelas porta dos fundos de um jatinho particular que aterrissava nos quintais do Ministério da Agricultura e Agropeculiaridades.
Mas dessas coisas, ninguém dos que contam a História Oficial quer falar num raio de visão que vai das docas do seguro porto de Santos à inefável e transcendente Esplanada dos Ministérios. Este é um governo que não rouba e não deixa roubar.