Geração Band-Aid
E você nem sabia que é um dos brasileiros que há dez anos está no centro da Geração Band-Aid - aquela que gosta de viver perigosamente. Nada mais emocionante do que viver sob o governo que começou nos estertores de 2000 finzinho da era FHC e se instalou definitiva e solidamente em 2002 no Brasil.
É um escândalo em cima do outro; uma emoção a cada instante. Uma vida eletrizante, uma aventura política, social e policial dia por dia, moment to moment, com direito a tudo e mais um pouco.
Você convive e sobrevive como se estivesse nas páginas de uma série de Ian Fleming. Mas o James Bond não é você; você não passa de um seguidor de script atônito e embasbacado dentro de uma enorme bíblia policialesca nacional.
Há dez anos, desde que o metalúrgico das greves subiu a rampa para cá, que o brasileiro trabalhador, tipo cidadão acima de qualquer suspeita e pagador de impostos oceânicos, vive sacudido pela presença do crime, da investigação despretenciosa e da revelação inútil de malfeitores.
Nesse roteiro você já viu de quase tudo: crime organizado popular e estatal, cartéis de mafiosos públicos e notórios, consultores mágicos, corruptos-gilete (ativos e passivos), propineiros, deputados e senadores (sem adjetivos pejorativos para evitar redundância), lavadores de dinheiro, ministros safados, presidentes safos e patetas, usurpadores, pequenos ditadores, grandes biltres, matadores profissionais, prefeitos mortos, guerrilheiros urbanos de baionetas caladas, governantes cegos, surdos e mudos...
É nesse enredo cotidiano que você está metido, meu caro leitor inadivertido. Você está socado dentro de um romance policial e o que de bom lhe resta é torcer para que o final seja uma boa surpresa, com a tradicional e sempre anunciada vitória do bem contra o mal. Você é brasileiro, não desiste nunca, acredita sempre. Crê que no fim há de ficar demonstrado que não pode haver crime perfeito. Por isso acredita que não há lugar para a impunidade, para o crime sem punição.
Mas para isso, você não pode ter carteirinha de aliado desse jeito de governar que, como sempre exalta a musa Marta, hoje ministra de solas gastas "o jeito que Lula nos ensinou". Você não pode ser um desses terceirizados que, pelo preço do voto e da subserviência, tomaram de assalto a máquina pública e fingem que lutam pela ordem e progresso do seu país.
Melhor para você continuar apenas como a peça do lado de cá dessa literatura barata e perigosa escrita pela destruidora Geração Band-Aid, a que gosta de viver perigosamente. Só assim lhe é dado o direito de demonstrar estranheza pelo crime e de julgar de sã consciência que o crime e o criminoso um dia voltarão a ser elementos estranhos à razão natural da ordem social no seu Brasil.
Enquanto isso, vá vivendo - da melhor e mais cautelosa maneira possível - vá sofrendo as emoções da grande aventura desse Brasil da Silva que lhe proporciona a cada dia, a cada momento, místério, espanto, inquietação e medo, muito medo e, com sobrada razão, medo até de ser feliz. O bom é que você ainda acredita na verdade.