Longe do Brasil Da Silva, Lula está nas nuvens, se sente à vontade para dizer o que lhe dá na telha e gozar até à última gota o prazer que lhe causa a liberdade de ter as mais rápidas e banais soluções para os problemas dos seus anfitriões. É como se fosse - não um superstar como pintaram e bordaram os jornais de Berlim; não O Cara, como galhofou Barack Obama - mas um Adonis exótico, de baixa estatura, que está muito menos para um governante democrático do que muito mais para um mau-exemplar teocrático.
Lulalá se comporta até um pouco menos como um ente divinal do que aqui se parece com o verdadeiro deus brasileiro. Lá fora, o Brasil Da Silva não tem problema. O problema é deles. Lulalá é só basófia e bem-humorada prepotência. Dá de sobra até para constrager a chanceler alemã que já não tem mais paciência com os arroubos bélicos de Mohamoud do Irã.
Mas, para quem é temente aos deuses, o medo de ter cometido um pecado imperdoável cresce à medida em que o fascínio do seu amo e senhor por uma cadeira cativa no Conselho de Segurança da ONU o impele inexorável e gradativamente a vender a alma aos demônios. Mais que a alma, dá a mão a tiranos como Muar Khadaffi, Fidel Castro, Hugo Chávez, Manuel Zelaya e outros sombrios compositores da mesma laia de prepotentes dominadores pelo mundo afora.
Pelo Brasil Da Silva adentro, beija e abraça - em irrefreáveis liturgias de insensibilidade e desfaçatez - Zé Sarney, Beira-Collor, Renan Calhordeiro, Jader Barbalho, Zé Arruda, todos aprendizes das mais infames bruxarias políticas.
Quando está por aqui, de passagem, Lula é um incomparável, um honorável comentarista de escândalos - profissão que alimenta com sua vocação estrabulega, esperta e suprema de procriá-los, uns atrás dos outros, provocando com a força do criador que seu corpo abriga, o efeito dominó que faz uns derrubarem os outros.
Com seus superpoderes realiza o milagre brasileiro de mostrar aos seus súditos fiéis que ele e seus apóstolos têm o país na mão e o resto no bolso. Aqui não tem maremotos, nem terremotos; há abalos que não chegam a ser sísmicos e atendem pela alcunha de escândalo. São freqüentes, mas - assim como o México, o Japão, as Ilhas Gregas já se acostumaram com os tremores da escala Richter - a gente com Lulaqui já se acostumou e tudo não passa de tremelique.
Os 14 crimes que deixaram a Famíglia Sarney tremebunda já passaram; Agaciel Maia é lama escorrida do vulcão ruminante do Parlamento pelas esteiras rolantes da Casa do Polvo - antro de tolerância insuperável na República dos Calamares. Aquele abalo já caiu no esquecimento e agora a vez é dos DEMensaleiros do Zé Arruda - clone da direita do Golbery mal-enjambrado Zé Dirceu que não chega a fazer cócegas em quem tem o rei na barriga.
Nas rápidas visitas que comete por aqui, Lula do Brasil Da Silva aplaca as misérias, o povo tem emprego, os desempregados têm bolsa, os patifes estão na cadeia, os picaretas foram varridos do Congresso, a violência urbana foi debelada, os aposentados e inativos estão salvos, as obras são tocadas, as estradas vão bem, obrigado; o pedágio vale a pena nas rodovias e nos morros; a saúde é quase perfeita; a dengue é culpa do povão que não se cuida; a febre-amarela amarelou; a gripe suína só dá em membros(!) da comitiva quando acompanha Lulalá; a fome zerou, a dureza acabou e o Rio de Janeiro continua lindo.
Nos regimes teocráticos é assim mesmo, o mestre e seus apóstolos têm o dom da obicuidade - resolvem num canto qualquer os problemas do mundo e colocam no outro canto os brasileiros sob o flanar feliz dos tapetes voadores. Tudo ao mesmo tempo. Ainda que não vejam nada, não ouçam nada, não saibam nada, não façam nada.
Mas, a teocracia é assim - é tirana quando parece apenas soberana; é divina mesmo que o poder seja des/humano; é perene... começa com um mandato, passa para dois e logo vem o terceiro e fica para todo o sempre, amém.
Nada abala, nada faz tremelicar a força, o poder de um teocrata. Nem a seus apóstolos. A não ser quando o grande alquimista - versão nacional de um conspícuo aiatolá, se acomete de comichão no escroto, não contém sua verborréia, deixa-se dominar pela víbora interior que não resiste à tentação de mais uma mordida na maçã e acaba cometendo o pecado da incontinência que faz seu verbo sucumbir à carne. Aí ele se excomunga: - Não posso viver sem... perereca!
Aí sim, é pesado demais para o andor que carrega o santo de barro; esse é um pecado mortal, capaz de merecer a condenação de fiéis de todas as seitas e igrejas, até mesmo daquelas que sentam em cima de malas e poltronas aéreas que escondem o dinheiro que cai do céu e escorre por cuecas e meias, num ritual repetitivo e profano, sem qualquer cerimônia.
Estamos todos no purgatório. Menos o mestre e seus apóstolos que vivem num paraíso. Para uma teocracia assim, não há diabo que agüente.