O medo

TENHA MEDO DO QUE O GOVERNO PODE FAZER COM VOCÊ. NO BRASIL GOVERNAR É SATISFAZER NECESSIDADES FISIOLÓGICAS.

2 de set. de 2012

Do metrô ao show do Quintas de Fevereiro

Sexta-feira, prenúncio de fim de semana. Resolvi andar de metrô para desanuviar a cabeça. E lá fui eu, na pele do escritor Garanhão de Pelotas, da Estação Central de Brasília rumo a Águas Claras, núcleo habitacional classe média alta a meio caminho de Guará, Taguatinga e outras cidades satélites.

Coisa assim só para passar o tempo; ir e voltar; curtindo uma rápida convivência itinerante; viagenzinha de vai e vem em horário folgado de mais uma manhã de vida útil no Distrito Federal. Lá fora, o sol era um esplendoroso anúncio de que se tratava do Rei dos Astros.

Na primeira parada, descem dois comportados passageiros e sobe um grupo de quatro gazeteiros - um gay pra lá de assumido e três garotas, todas elas de dentes de lata, cheia de arames e pingos de solda nos risos tipo gargalhada debochada.

Barulhenta, a molecada se acomontoou na bancada à minha frente e, com o menosprezo pelo tempo, espaço e ouvido dos outros, foi gargalhando por um monte de besteira que saía da gazela deslumbrada, líder inconteste da turma de mal-educados falsos porta-vozes da geração que nos enche o saco.

Desviei os olhos daquele monturo, mas não consegui tampar os ouvidos o suficiente para evitar o som estridente, exagerado e agressivo de suas piadas desgraciosamente infames.

Mochila murcha sobre os ombros arqueados, o efebo de brinquinhos de argola nas duas orelhas, sombra nos olhos negros de jabuticaba e trejeitos de musa morena do subúrbio, arrancava aplausos esparsos e suspiros de admiração das suas três adoradoras de folguedos cotidianos. Aula que é bom, ninguém ali queria.

Fui obrigado a escutar. O babaquinha tresloucado, se exibia quanto podia:

- Aqui ó! Quero ver agora me chamarem de biba! Quero ver fazerem bullying comigo! Eu não sou mais uma biba! Eu sou um Bicha... Bichaaaa! Biiiicha poderoooosa! - e esperava a reação da galerinha.
- Quéquequé, quéquiqui, quaquaquá...
- Sou bicha poderoooosísssima! O delegado tá do meu lado. Qualquer coisa digo que é bullying e mato a pau! A pau, viram? Paaau!!!
- Quéquequé, quéquiqui, quéquequé...
- A lei tá do meu lado. Sou bicha, bichinha, bichona! Sou aquele que sou e pronto! Dou pra quem quero e quando quero!
- Quéquequé, quéquiqui, quéquequé...

Um senhor de boa idade. Boa idade é bondade. Um senhor pra lá de passado nos anos, incomodado pelo comportamento imbecil do grupelho, reagiu com sutileza:

- Ei, amiguinho, quanto é que está o jogo aí?
- Como assim, meu senhor?... - Fez-se de desentendida a biba exbicionista.
- É que você não para de irradiar desde que entrou aqui...
- Ah, vai te deitar vinaaagre! - desdenhou o safardana.

E o metrô ia que ia. Até que não aguentei. Aquilo era demais para o Garanhão de Pelotas. Larguei de lado a janela que me mostrava uma Brasília linda correndo a meu lado e me virei para o espalhafatoso:

- Dá pra ficar quieto, ô Bicha Poderoooosa?!?
- O quêêê... Bicha Poderosa? Você tá me chamando de biiicha?!? Quer um processo por discriminação, seu bosta velha?

Aí me levantei. Fui até o idiota e, esganando-o com a mão direita, enfiei-lhe a esquerda no saco, de tal forma que o dedo pai-de-todos se imiscuiu em seu esfíncter:

- Bosta velha é o que sai da tua cloaca, putão fedorento! Cala boca que ninguém aqui tem que escutar suas basófias, chinelão de almanaque!
- Aaaai, aaai, ocê tá me machucaaaando! Tenho meus - cof, cof, ufa! - tenho meus direeeeitos...
- Fecha a fossa, seu berdamerda! Eu já comi 20 vezes a tua mãe e não ando por aí fazendo estardalhaço dessa besteira.

A porção palhaço da biba que tinha assumido o seu lado poderoso se desmanchou em seguida e virou pranto social. Logo o exibidão virou um reles excluído da Lei Maria da Penha. Era só um perturbador, não um típico exemplar do terceiro sexo desse terceiro milênio. Um pernicioso que, com um pé na bunda, fiz descer na próxima estação.

Pouco depois, começava a viagem de volta. Cheguei na Estação Central do Metrô de Brasília a tempo de chegar em casa e sorver um bom uísque, tomar um banho melhor ainda e me arrumar todo para assistir a mais um show do Quintas de Fevereiro, a banda de rock mais afinada e comportada que conheço, num pub lá de Águas Claras. Ganhei o fim de semana.